Sonetos Simultâneos
E um quarto
Soneto Ingênuo
Se o lento abrir de lábios de mulher Existe, em belas faces femininas; Se vejo as brincadeiras das meninas, Refletidas numa abelha a colher; Se o riso abre nas crianças e nas nuvens, E tudo é um contínuo nascimento; Se há remédio a cada sofrimento; Se todos nós, algum dia, fomos jovens; Se tudo isso, concluo: só o bem existe. O engano que falou pelo momento Em que a vida inteira pareceu-me triste. Só que no fundo do meu pensamento, Uma questão incômoda persiste: Por onde vai a dor e o detrimento?
Soneto da Sucessão
O flamboiã me encontra na varanda e encaro os galhos tortos no jardim Hoje os galhos, curvados para mim Secaram o rubor, tornei-me granda. Como seria feliz, se a vida segue? Um sorriso é prenúncio de um lamento. Flamboiã, vendo o teu esgotamento, Lembro-me que esta sina nos persegue: A alegria nos visita, isso sim, Mas não mora, nem em ti, nem em mim, Em breve estamos sós neste jardim. A alegria, esse grãozinho, por fim, Escorrega das mãos, ou nós, assim, Saímos dela até a ponta do estafim.
Soneto Decisivo
"Comemos do que deixam para trás, Os estoques e as sobras vão ao ninho" Falou-me um buliçoso passarinho. O corvo, em sua vez, disse-me: "Crás!" Já reparou que o bem voa e nos chama, O sedentário que deixa a sua casa, Sossega sem deixar morrer a brasa E repousa na rocha feita cama. E a cicatriz da dor, que deixa marca -- A dor sólida, pura e congelada --, Voa junto, pois o vento pesa igual. Nas noites que seguem nas mãos da parca, Viva-se com os olhos na alvorada, Escreva ainda um soneto final.


Muito bom cara. Continue o bom trabalho.